quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Salto rumo a um novo bronze olímpico

O ano de 1936 é um bom exemplo de como os meios políticos procuraram - em determinados períodos da história da Humanidade - usar a popularidade dos grandes eventos desportivos para evidenciar ao Mundo as suas ideologias. Berlim acolheu nesse referido ano aquela que era já inequivocamente a maior manifestação desportiva do planeta, os Jogos Olímpicos. A Alemanha de então vivia sob o regime nazista comandado por Adolf Hitler. Vendo nos Jogos a ferramenta ideal para mostrar ao Mundo a superioridade da raça ariana o líder nazi não se pouparia a esforços para fazer destas as Olimpíadas mais espetaculares da história. Hitler montou então uma autêntica máquina de propaganda política através dos Jogos. Com um orçamento ilimitado não deixou ao acaso o mínimo detalhe que pudesse colocar em perigo a sua estratégia de assalto ao poder através do mega evento desportivo. Um estádio olímpico foi construído propositadamente, e aos atletas alemães tudo era dado e permitido para que se pudessem preparar conveniente para o evento e desta forma conquistar o máximo número de medalhas de ouro que traduzissem a superioridade da raça ariana. Bom, esta é uma curta descrição do cenário em que decorreram as Olimpíadas de 1936, que no final acabariam, na verdade, por provocar um terrível amargo de boca ao próprio Hitler - muito por culpa de um tal Jesse Owens - mas que aos portugueses deixaram doces lembranças. E são precisamente essas doces lembranças que servem de mote para a viagem ao passado que hoje iremos efetuar, uma viagem rumo à medalha de bronze conquistada pela nação lusa em Berlim. Feito alcançado por uma modalidade que na primeira década do século XX trouxe alegrias e prestígio a Portugal: o hipismo. Nunca será demais recordar que foi pela mão de três nobres cavaleiros (António Borges, Hélder de Souza e José Mouzinho) que em 1924 o nosso país arrecadou nos Jogos de Paris a primeira medalha olímpica da sua história, efeméride já aqui relatada com pompa e circunstância no Museu Virtual do Desporto Português. Doze anos depois da conquista do bronze olímpico na Cidade Luz eis que Portugal voltou a saltar com êxito rumo a uma nova medalha de bronze, desta feita por intermédio de José Beltrão, Luís Mena e Silva, e Domingos de Sousa Coutinho, três cavaleiros provenientes da mais fina flor do hipismo português daquele tempo que nos Jogos de Berlim subiram ao degrau mais baixo do pódio no Grande Prémio das Nações. Porém, a epopeia dos três oficiais do Exército não principiou da melhor forma. Na antecâmara da viagem para Berlim, Silvain, o cavalo do tenente Mena e Silva sofreu uma queda e ficou sem condições físicas de prosseguir a aventura olímpica, facto que desde logo colocou em risco a presença do cavaleiro nos Jogos. O também tenente José Beltrão, que haveria de ser a pedra fundamental na conquista do bronze olímpico, desenrascou em cima do embarque o seu companheiro de equipa, emprestando-lhe um dos seus dois cavalos, no caso o Fossette. Assunto resolvido. Estavam no entanto longe de ter um fim as dificuldades da equipa portuguesa nesta sua primeira aventura olímpica. As maiores complicações surgiram quiçá no dia da prova, do Grande Prémio das Nações, que juntou 18 equipas em busca das medalhas. Foi uma competição dura, difícil, com um traçado composto por 13 obstáculos de elevado grau de dificuldade, facto comprovado pela desistência de 11 equipas. Com raça, alma (enorme) e talento os portugueses aguentarem-se em pista, contornaram os obstáculos, acabando por chegar às medalhas com todo o mérito e justiça. Montando o seu Merle Blanc, o capitão Sousa Coutinho foi 16º, enquanto que Fossette e Mena e Silva ficou na 21ª posição. A performance de José Beltrão e do seu (cavalo) Biscuit - os últimos da equipa nacional a entrar na pista - haveria de ser decisiva na conquista da medalha. O sexto lugar por si alcançado somado aos resultados dos seus companheiros de equipa seria suficiente para que Portugal subisse ao pódio e receber a medalha de bronze, a terceira da sua história olímpica, e a segunda obtida por através do hipismo. Em termos de pontuação Portugal somou neste Grande Prémio das Nações 56 pontos, sendo apenas superado pela Alemanha (medalha de ouro) e pela Holanda (medalha de prata). Beltrão (que haveria de ter desfecho de vida trágico, já que a queda de um cavalo durante um treino no Hipódromo do Campo Grande, em 1948, tirou-lhe a vida) fez em Berlim uma prova quase perfeita, e não fossem os três obstáculos derrubados talvez o bronze tivesse sido transformado em ouro.  

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